Em meio ao desastre por qual passa o estado do Rio Grande do Sul, os abrigos de animais estão lotados e a preocupação com a reprodução descontrolada, assim como com acidentes por agressão são questões que devem ser avaliadas com cautela.
Ciente desta situação e com informações que estão sendo repassadas por médicos-veterinários na linha de frente do cuidado com os animais, o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) alerta para os seguintes pontos:
Riscos associados aos mutirões de castração em situações de desastre:
- Condições de emergência desfavoráveis: em meio a uma crise, as condições de higiene e segurança podem ser comprometidas, aumentando o risco de complicações durante procedimentos cirúrgicos, especialmente naqueles considerados eletivos;
- Escassez de recursos e infraestrutura: os recursos médicos, materiais e humanos necessários para realizar cirurgias de castração podem estar limitados em situações de desastre, o que compromete a qualidade e segurança dos procedimentos e ainda podem fazer falta para procedimentos de urgência e emergência que outros pacientes necessitem;
- Avaliação individual das condições dos animais: cada animal é único e pode apresentar condições de saúde pré-existentes que aumentam o risco de complicações durante a cirurgia. A condição de avaliação clínica em casos de desastres também pode ficar prejudicada, devido à precariedade do ambiente. Realizar mutirões sem uma avaliação adequada pode expor os animais a procedimentos cirúrgicos desnecessários e potencialmente perigosos e caracterizar imprudência profissional;
- Necessidade de consentimento informado: Em qualquer situação, inclusive em situações de desastres em massa, é fundamental obter o consentimento informado do responsável legal pelo animal antes de realizar qualquer intervenção cirúrgica. A falta desse consentimento pode resultar em repercussões legais e éticas.
Recomendações técnicas:
- Priorizar intervenções de socorro urgentes: em situações de desastre em massa, é crucial priorizar intervenções que atendam às necessidades imediatas de saúde e segurança dos seres humanos e dos animais afetados;
- Avaliação individual por médicos-veterinários: os médicos-veterinários devem avaliar individualmente cada animal para determinar se a castração é uma intervenção necessária e segura e se dispõe de meios adequados mesmo em situação de desastre, não permitindo a interferência de pessoas leigas em seus trabalhos e julgamentos profissionais;
- Garantir infraestrutura e recursos adequados: antes de realizar qualquer procedimento cirúrgico, é fundamental garantir que haja recursos e infraestrutura adequados disponíveis para garantir a segurança e o bem-estar dos animais;
- Obter consentimento informado: para realização de procedimento cirúrgico, deve-se obter o consentimento informado do responsável legal pelo animal antes de realizar o procedimento, mesmo em situações de desastre. Exceção é feita apenas para os casos de iminente risco de morte ou de incapacidade permanente do paciente, onde médico-veterinário deve:
I – proceder ao atendimento e à intervenção independentemente do prévio consentimento e autorização;
II – registrar no prontuário todas as informações relacionadas à eventual recusa de consentimento ou autorização ou impossibilidade de obtenção.
- Seguir o Plano Nacional de Contingência de Desastres em Massa Envolvendo Animais: desde 2021 o CFMV disponibiliza material com uma série de recomendações técnicas para a atuação profissional em situações de desastre, disponível no link: https://www.cfmv.gov.br/plano-nacional-de-contingencia-de-desastres-em-massa-envolvendo-animal/comunicacao/publicacoes/2020/10/05/#1
O CFMV alerta que mutirões de castração em meio a situações de desastre em massa representam riscos significativos para a saúde e o bem-estar dos animais, bem como para a eficácia das operações de socorro. Portanto, é fundamental que os profissionais envolvidos nessas situações priorizem intervenções que atendam às necessidades imediatas de saúde e segurança dos seres humanos e dos animais afetados, sempre sob a orientação de médicos-veterinários e com o consentimento informado do responsável legal pelo animal.
Neste momento, muitos dos tutores não tiveram condições de resgatar seus animais nos abrigos e, portanto, não tem condição de autorizar procedimentos eletivos como o da castração.
Neste cenário existe ainda uma insegurança jurídica aos profissionais que estão na linha de frente, caso participem de iniciativas para além daquelas prioritárias e essenciais à preservação da vida e bem-estar dos animais nesta condição provisória.
A Resolução CFMV 1596, de 26 de março de 2024 traz as diretrizes gerais para os responsáveis técnicos por estas atividades, as quais devem ser observadas a qualquer tempo.
Ainda, a Resolução CFMV 1511, de 28 de março de 2023 institui diretrizes para a atuação de médicos-veterinários e zootecnistas em desastres em massa envolvendo animais domésticos e selvagens, complementando e dando suporte às atividades do Plano Nacional de Contingência de Desastres em Massa Envolvendo Animais publicado pelo conselho.
Sendo assim recomendamos que, em um momento posterior, qualquer iniciativa de esterilização cirúrgica de caninos e felinos domésticos com a finalidade de manejo populacional seja oportunamente realizada e amparada por definição e autorização conjunta com os órgãos públicos municipais de saúde e meio ambiente, bem como com o ministério público e Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), de forma a resguardar a atuação profissional.
Conselho Federal de Medicina Veterinária