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BLOG – Conhecendo a Buprenorfina

6 de março de 2024

O cloridrato de buprenorfina é um potente opioide agonista μ semissintético, derivado da tebaína. Tem uma estrutura bastante semelhante à morfina, porém com alta lipossolubilidade e características que a diferenciam, como um grau de afinidade ao receptor μ muito elevado, tendo um efeito inicial mais lento e uma duração de ação mais longa que os demais opioides agonistas do receptor μ, o que denota propriedades farmacológicas diferenciadas.

Apesar de sua alta afinidade pelo receptor μ, a buprenorfina apresenta uma atividade parcial; provendo analgesia moderada e sedação variável, sendo, entretanto, muito segura em termos de propiciar poucos efeitos adversos, destacando-se a baixa depressão respiratória.

A buprenorfina é indicada principalmente como agente analgésico para controle da dor leve a moderada em cães e gatos, após procedimentos cirúrgicos, como ovariohisterectomia de rotina, orquiectomia, procedimentos ortopédicos simples, mas não é indicada para controle álgico após procedimentos que cursam com dor severa.

Foi demonstrado que a buprenorfina tem propriedades analgésicas semelhantes às da morfina após artrotomia eletiva em cães saudáveis, sem causar sedação excessiva. E alguns estudos demonstraram que quando associada a AINEs, atua melhor no controle da dor, exercendo um efeito sinérgico.

A buprenorfina também ganhou popularidade usada em combinação com dexmedetomidina, cetamina, tiletamina/zolazepam e outros medicamentos sedativos ou anestésicos na medicina e na prática clínica.

Exemplos de combinações anestésicas injetáveis usando buprenorfina incluem dexmedetomidina-cetamina-buprenorfina, midazolam-dexmedetomidina-buprenorfina.

Farmacocinética e Dosagem

Os resultados dos estudos farmacocinéticos e farmacodinâmicos do fármaco IV e IM em gatos, demonstraram uma histerese negativa, indicando que os níveis plasmáticos efetivos da buprenorfina não estão necessariamente associados aos efeitos antinociceptivos da droga.

Em cães, a buprenorfina é metabolizada predominantemente no fígado, sendo a principal via de eliminação a excreção biliar nas fezes.

A dosagem recomendada para ambas as espécies é de 0,01 a 0,04 mg/kg a cada 6 horas IV, IM ou SC, sendo essa última via a menos indicada por ter menor eficácia. Adicionalmente, os protocolos de tratamento da dor que envolvem buprenorfina devem adaptar os regimes posológicos ao estado do paciente e ao nível de dor, através da monitoração do conforto analgésico, em vez de utilizar intervalos de dosagem predeterminados.

A administração oral transmucosal de buprenorfina na dose de 0,02 a 0,04 mg/kg é comum, especialmente em gatos. Estudos farmacocinéticos da buprenorfina por via transmucosal oral demonstraram níveis plasmáticos eficazes e capacidades antinociceptivas comparáveis aos da administração intravenosa.

No Brasil temos uma formulação para uso injetável, que contem 4 mg de cloridrato de
Buprenorfina por ml, o BENIV®,  que pode ser empregada na dose de 20 μg/kg de peso vivo (ou seja, 0,05 ml do produto para cada kg peso vivo), com intervalo mínimo entre doses de 6 horas, por até 3 dias, em cães e gatos a partir dos 3 meses.

Vale ressaltar que uma das vantagens do uso da buprenorfina em doses clínicas, como citado anteriormente, é a baixa incidência de depressão respiratória e efeitos cardiovasculares discretos em cães e gatos. Pode ocorrer bradicardia leve e hipotensão, mas são alterações cardiovasculares clinicamente insignificantes quando comparamos com outros opioides.

A buprenorfina tem efeitos depressores respiratórios mínimos e não está associada a hipertermia clinicamente significativa em gatos; pelo contrário, doses maiores causaram maior grau de anti-nocicepção em gatos expostos à estimulação térmica.

Doses maiores de buprenorfina não estão associadas a nível aumentado de sedação ou efeitos adversos.

Vantagens & indicações

A buprenorfina tem algumas vantagens sobre os opioides agonistas μ.

Proporciona efeitos analgésicos moderados sem causar uma sedação excessiva e com menor potencial para respostas adversas comuns quando utilizamos agonistas μ-opioides (por exemplo, bradicardia potencial, depressão respiratória leve).

A buprenorfina por via transmucosal é uma opção para o tratamento da dor a longo prazo em cães e gatos.  Tal via é mais efetiva em felinos pois o pH alcalino da cavidade oral nesta espécie favorece a biodisponibilidade da buprenorfina que é uma base fraca. Já foi demonstrado experimentalmente que na dose de 20μg/kg do agente por via transmucosal foi tão efetiva quanto a via intravenosa com relação aos efeitos antinociceptivos. Tal via de administração é, portanto, uma alternativa que facilitaria a administração do opioide por via injetável em felinos, que muitas vezes tem contenção mais difícil.

A combinação de buprenorfina com um AINE é uma boa opção para se fornecer analgesia após procedimentos de rotina que envolvem dor leve a moderada. E ainda tem a vantagem de proporcionar boa analgesia em gatos sem a necessidade de regimes de doses múltiplas.

Em comparação com os agonistas μ-opioides completos, a buprenorfina tem algumas particularidades, como a alta afinidade da droga pelo receptor μ-opioide, que inibe os poderia inibir os efeitos de alguns agentes agonistas μ-opioides completos, quando usados concomitantemente.

Um estudo demonstrou que quando a buprenorfina foi administrada com sufentanil, um potente opioide, a cães submetidos a ovariohisterectomia de rotina, foi necessária uma quantidade significativamente maior do agonista μ puro para fornecer analgesia em comparação com cães que receberam sufentanil sozinho.

Os autores do estudo recomendaram suspender a terapia com buprenorfina por pelo menos 6 a 8 horas antes da administração do protocolo anestésico que inclui opioides agonistas puros de receptores μ.

Mas em relação a hidromorfona, a analgesia não foi afetada quando utilizado a buprenorfina.

Conclusão

A buprenorfina tem muitas características únicas que a distinguem de outros agonistas μ-opioides com vantagens clínicas significativas.

A utilização da buprenorfina associada a tranquilizantes ou sedativos como benzodiazepínicos, agonistas dos receptores alfa 2 adrenérgicos (sendo a dexmedetomidina o agente da classe mais empregado atualmente) ou acepromazina (neuroleptanalgesia) favorece a tranquilização, ao mesmo tempo em que permite minimizar a ocorrência de eventos adversos. Cabe lembrar que a associação do opioide ao anti-inflamatório não esteroidal, como o meloxicam e robenacoxibe, em felinos ou diversas classes de AINES em cães, por exemplo, proporciona melhor analgesia. Importante ressaltar que os AINES não devem ser administrados em pacientes hipovolêmicos ou hipotensos.

Embora seu início de ação seja lento, a buprenorfina tem longa duração de ação, com analgesia boa a moderada e poucos efeitos colaterais. A buprenorfina pode ser administrada por múltiplas vias e é eficaz tanto em cães quanto em gatos. Os fármacos a base de buprenorfina introduzidos recentemente no mercado brasileiro proporcionam controle uniforme da dor com a vantagem de exigir administração pouco frequente.

Por Dra. Sandra Mastrocinque

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