Influência da dieta nas enfermidades cardíacas de cães e gatos?
A cardiomiopatia dilatada (CMD) é reconhecida como uma condição genética em cães, geralmente em raças grandes ou gigantes, como o Doberman Pinscher, Dogue Alemão ou Wolfhound Irlandês, mais comumente machos desde a meia idade até a idade avançada. Também é observado em Cocker Spaniels associada à deficiência de taurina.
Acredita-se que seja menos comum em cães de raças pequenas e médias, mas suspeita-se que possam haver subnotificações pela complexidade e custos dos testes diagnósticos e tratamento. Outras raças relatadas foram o Beagle, Border Collie, Boston Terrier, Bull Terrier, Chihuahua, Dálmata, Springer Spaniel Inglês, Retriever de Pêlo liso, Buldogue Francês, Setters, Jack Russel Terrier, Maltês, Schnauzer, Pomeranian, Pug, Rhodesian Ridgeback, Rottweiler, Saluki, Samoieda, Staffordshire Bull Terrier, Dachschund de pêlo comprido, Vizsla, Whippet e Yorkshire Terrier.
Em julho de 2018, o FDA (Food and Drug Administration) alertou sobre relatos de CMD em cães que consumiam uma determinada dieta. Esses relatos chamaram a atenção pelo fato de não terem ocorrido em raças geneticamente predispostas à enfermidade, e que recebiam uma dieta contendo predominantemente legumes como ervilhas, lentilhas e batatas. Essas dietas são rotuladas como “Grain Free” ou “Zero grãos”.
Desde então, o Centro de Medicina Veterinária do FDA iniciou uma investigação envolvendo Médicos Veterinários, nutricionistas, patologistas e epidemiologistas, coletando e avaliando informações sobre os casos de CMD e as dietas que os cães recebiam antes de adoecerem. Esse estudo tem como parceiro-chave a VET-LIRN, (Veterinary Laboratory Investigation and Response Network), uma colaboração de laboratórios de diagnóstico veterinário e governamental.
A investigação consiste em revisão de registros médicos e entrevistas sobre a dieta e manejo ambiental em cães e gatos com enfermidades cardíacas, com e sem CMD.
Foram revisados registros de 340 cães e 9 gatos, dos quais 202 cães e 6 gatos tinham CMD. Cento e vinte e três cães (61%) e 6 gatos (100%) com CMD confirmada desenvolveram insuficiência cardíaca congestiva (ICC).
Dos animais diagnosticados com CMD, 42% apresentaram ao menos uma mensuração sanguínea de taurina baixa. Golden Retrievers representaram 37% de todos os cães com baixo nível de taurina e CMD
De acordo com os ecocardiogramas controle revisados, alguns animais com CMD melhoraram após tratamento, alteração da dieta e suplementação de taurina. O estudo ainda está em andamento com novos exames controle para melhor entender os efeitos da dieta e da suplementação com taurina nas doenças cardíacas.
Cães de raças predispostas à CMD e que consumiam dieta “Grain Free” também estão tendo seus registros revisados, com alguns casos apresentando melhora após a alteração da dieta.
Para caracterização das dietas relatadas nos casos de CMD, os rótulos foram examinados para determinar se o produto era isento de grãos (“Grain free, ou seja, não continha milho, soja, trigo, arroz, cevada ou outros grãos) e se os produtos continham ervilhas, lentilhas, grão de bico, feijão ou batata (incluindo batata doce). Mais de 90 por cento dos produtos eram “Grain free” e 93 por cento dos produtos relatados continham ervilhas e/ou lentilhas. Uma proporção muito menor continha batatas.
As fontes de proteína animal relatadas variaram amplamente, e muitas dietas continham mais de uma fonte de proteína. As mais citadas foram frango, cordeiro e peixe; no entanto, algumas dietas contêm fontes de proteína atípicas, como canguru, bisão ou pato. Nenhuma fonte de proteína animal foi predominante.
A porcentagem média de proteína, gordura, taurina total, cistina total, metionina total, metionina-cistina total e conteúdo de amido resistente com base na matéria seca (em outras palavras, após a remoção de todo o teor de umidade) foram semelhantes para ambos os produtos “Grain free” e produtos com grãos.
Pesquisas nutricionais indicam que a taurina geralmente não é considerada um aminoácido essencial para cães, porque esses animais podem sintetizar taurina a partir de cisteína e metionina. Quase todos os produtos “Grain free” tinham valores de metionina-cistina acima do requisito nutricional mínimo. O FDA ainda está coletando informações para entender melhor se (e como) o metabolismo da taurina (tanto absorção quanto excreção) pode ter um papel nesses relatos de cardiomiopatia dilatada canina.
Estudos anteriores sugerem que Golden Retrievers podem ser geneticamente predispostos à deficiência de taurina, o que está bem documentado como potencialmente causador de CMD. Na suspeita de que cães desta raça possam estar afetados, a verificação dos níveis de taurina ou a realização de ecocardiograma pode estar indicada.
O papel do Médico Veterinário
Médicos Veterinários devem trabalhar para a troca de informações sobre casos de CMD, e possíveis fatores associados também no Brasil, bem como que tipo de investigação pode ser útil. Cardiologistas e nutricionistas também podem dar suas valiosas colaborações para entendermos mais sobre esses casos, bem como a resposta ao tratamento.
O Vet Sapiens incentiva os profissionais de Medicina Veterinária a relatar casos bem documentados de CMD em cães com suspeita de associação com a dieta. Quanto mais informações forem compiladas, principalmente sobre histórico alimentar, registros médicos e testes diagnósticos, mais benéfico será para o real entendimento desta condição, bem como sua prevenção e tratamento.
Links importantes:
FDA Investigation into Potential Link between Certain Diets and Canine Dilated Cardiomyopathy
Vet-LIRN Update on Investigation into Dilated Cardiomyopathy
FDA Provides Third Status Report on Investigation into Potential Connection Between Certain Diets and Cases of Canine Heart Disease